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Por que é tão difícil usar menos o Instagram? – Por Maria Cecília


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Por Maria Cecília Oliveira Gomes, Doutoranda em Filosofia e Teoria Geral do Direito na Faculdade de Direito da USP. Professora convidada da USP, PUCRS e de outras instituições de ensino. Foi Pesquisadora Visitante na Data Protection Unit do Council of Europe (CoE) na França. Foi Pesquisadora Visitante no European Data Protection Supervisor (EDPS) na Bélgica. Pós-graduada em Propriedade Intelectual e Novos Negócios pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

P U B L I C I D A D E

 

Já ficou tanto tempo rolando o feed do Instagram que, quando você notou, haviam se passado horas? Pode ficar tranquilo, essa situação acontece com muita gente. Na verdade, o formato de “feed infinito” usado pelas redes sociais é pensado para ter esse efeito. Existe ainda uma associação desses conteúdos de plataformas como Instagram Reels e TikTok à produção de certos hormônios capazes de nos deixar mais felizes. Assim, fica ainda mais difícil parar a rolagem infinita.

As redes sociais são parte importante da vida moderna, oferecendo uma infinidade de conexões e oportunidades de compartilhamento de informações. Diariamente, temos acesso fácil a uma quantidade enorme de dicas, tutoriais, vídeos engraçados e animais fofinhos. Contudo, para muitas pessoas, elas se tornam verdadeiros vícios, gerando efeitos negativos em outros setores da vida.

Os efeitos negativos desse uso podem ser traçados, por exemplo, até casos de distorção de imagem, em que cada vez mais pessoas têm problemas de autoestima e bem-estar por se compararem às imagens vistas ali, nas redes. No entanto, o que tendemos a esquecer quando estamos nessas plataformas, é que a maioria das fotos publicadas ali passou por algum tipo de tratamento ou filtro – isto é, não são reais.

Essa incapacidade de deixar de usar as redes sociais é, na verdade, uma estratégia. Não é só pelo conteúdo interessante, mas a estrutura e o design de cada plataforma é projetado para nos manter conectados o máximo de tempo possível. O fluxo interminável de informações nos incentiva a rolar incessantemente para baixo, na esperança de encontrar algo interessante. Ao manter o feed em constante atualização e apresentar conteúdos personalizados, as redes sociais alimentam nosso desejo de descobrir mais.

E, então, quanto mais tempo as pessoas passam, mais ficam conectadas a essas redes, mais anunciantes querem pagar para estar ali. Esse é o grande ponto. A manutenção dos usuários ali por horas é uma forma de dizer para as marcas “olha essas pessoas aqui! Elas poderiam estar vendo seu produto!”. Portanto, quanto mais tempo passamos ali, mais lucro eles têm.

Não é apenas a existência de um feed sem fim que nos faz permanecer vinculados às redes. Existem vários outros mecanismos que nos condicionam a esse movimento e um deles é justamente o movimento de rolar a tela para atualizar. Mas, existe outra semelhança ainda mais importante aqui: assim como cassinos e jogos de azar: a possibilidade de ganhar alguma coisa.

Ao aplicar essa mesma dinâmica de recompensa e antecipação nas redes sociais, as plataformas criam uma sensação de gratificação instantânea toda vez que atualizamos o feed. Essa ação nos leva a esperar por novas notificações, mensagens ou atualizações, criando um ciclo vicioso de busca por estímulos.

No texto “Why the infinite scroll is so addictive?” [Por que a rolagem infinita é tão viciante?] o autor Grant Collins, explica que a cada puxada na alavanca das redes sociais, esperamos receber algo em troca. Um vídeo do nosso YouTuber favorito, uma nova piada, uma mensagem de alguém com quem queremos falar.

Esse mecanismo de recompensa funciona ainda ativando hormônios responsáveis pela liberação da sensação de felicidade e bem-estar — a dopamina. Em uma entrevista ao jornal The Guardian, a Dra. Anna Lembke, especialista em questões envolvendo vícios, explica que nos voltamos para as redes sociais buscando validação, atenção e distração em cada rolagem, like ou tuíte.

Cada ação é motivada pela busca por mais dopamina. O hormônio, além de ser associado a “se sentir bem”, ela explica, nos motiva a fazer coisas que vão nos dar prazer. Nesse caminho, essa validação gerada pelas redes sociais, nos proporciona a liberação desse efeito — e estamos sempre querendo mais.

O que a Dra. Anna Lembke recomenda para driblar esses efeitos é buscar sensações de prazer que vão levar mais tempo para serem atingidas. São ações ou buscas que vão ser mais trabalhosas, mas nos proporcionam uma sensação de prazer mais duradoura. Estabelecer limites de tempo, desconectar-se regularmente e priorizar atividades off-line são medidas importantes para encontrar um equilíbrio saudável entre o mundo virtual e o mundo real.

Indo além da responsabilidade dos usuários, também é crucial que as próprias empresas sejam cobradas e assumam a responsabilidade de projetar suas plataformas de maneira ética, considerando o bem-estar dos usuários. A transparência na coleta de dados, a implementação de recursos que promovam o uso consciente são passos importantes para tornar as redes sociais menos problemáticas.

Em última análise, o desafio de se afastar das redes sociais está intrinsecamente ligado à maneira como essas plataformas são projetadas para manter nossa atenção. No entanto, ao reconhecer esse vício e buscar uma mudança consciente de hábitos, podemos recuperar o controle sobre nosso tempo e bem-estar, aproveitando os benefícios das redes sociais sem cair em suas armadilhas.

 

AI

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