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Inpe: Mato Grosso teve metade da área devastada na Amazônia em fevereiro


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O desmatamento na Amazônia e no cerrado teve um salto em fevereiro e bateu o recorde para o mês, segundo dados do Deter, sistema do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), que reúne informações para o combate ao desmate quase em tempo real.

P U B L I C I D A D E

 

No acumulado para todo o mês de fevereiro, a área com alertas foi de 321,9 km² na Amazônia. O índice representa um crescimento de 62% em relação ao ano passado (198,6 km²), que era, até então, o mais alto da série histórica iniciada em 2015.

 

Os estados mais desmatados da Amazônia foram Mato Grosso (161,8 km²), responsável por metade da área devastada no bioma, Pará (46,4 km²) e Amazonas (46,3 km²), seguido por Roraima (31,1 km²), onde fica a maior parte da Terra Indígena Yanomami.

 

No cerrado, a situação foi ainda pior, com números que chegaram a 557,8 km² e alta de 97% em relação a 2020, que tinha o recorde anterior, de 282,8 km². Bahia (268,2 km²), Tocantins (67,5 km²), Piauí (63,2 km²), e Maranhão (51,6 km²) tiveram os piores números no cerrado. A região, conhecida como Matopiba, é a principal fronteira do desmatamento no bioma.

 

Somando os dois biomas, a área destruída chega a quase 880 km², equivalente a mais da metade da cidade de São Paulo (1.521 km²). O início do ano é chuvoso tanto na Amazônia quanto no cerrado, o que dificulta a derrubada da vegetação e leva a números mais baixos de perda de vegetação, na comparação com outras épocas. Assim, as altas taxas apontam para uma lacuna no combate ao desmatamento. 

 

Em nota técnica publicada após a divulgação dos números, o MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima) afirmou que, junto de órgãos de fiscalização como Ibama, ICMBio e Serviço Florestal Brasileiro, tomará medidas para “responsabilizar e embargar remotamente desmatamentos que não possuírem autorização válida, dentre outras medidas administrativas, que poderão inclusive bloquear o acesso dos imóveis com desmatamento ilegal a crédito e à cadeia de compradores do agronegócio”.

 

O texto também aponta que a soma de janeiro e fevereiro (489 km2) em 2023 é menor do que a registrada no ano passado, quando chegou a 629 km2. A socioambientalista Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, voltado à regulação e a riscos climáticos, ressalta que o Deter é um alerta precoce, mas não é o dado fechado do desmatamento (os números oficiais são de outro sistema do Inpe, o Prodes, e são divulgados duas vezes ao ano).

 

Ainda assim, ela pondera que análises feitas pela organização apontam para uma lentidão nestes quase 70 dias do novo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), incluindo na nomeação de profissionais para ocuparem cargos importantes.

 

“Sim, houve uma mudança de discurso e isso é importante, mas o governo está se estruturando vagarosamente em termos de política. A gente detectou poucas ações no sentido de construir ou reconstruir políticas públicas.”

 

Ela diz, no entanto, que foram encontradas medidas positivas no combate ao garimpo ilegal e, com a nomeação do novo presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Rodrigo Agostinho, existem indicativos de que podem acontecer grandes ações de fiscalização em breve.

 

“Esse [índice do] Deter altíssimo tem a ver com o governo ainda não ter entrado em cena no chão demonstrando força. E é quando isso acontecer que o desmatador que está lá na ponta vai perceber o risco real de estar praticando essas atividades”, afirma.

 

O Deter mapeia e emite alertas de desmate com o objetivo de orientar ações do Ibama e outros órgãos de fiscalização. As informações são colhidas por satélite e o sistema detecta apenas alterações na cobertura florestal maiores do que 25 hectares. Devido à cobertura de nuvens —maior em períodos chuvosos—, nem todas as cicatrizes de desmate são identificadas.

 

Em nota, o MMA disse que a concentração de nuvens na região amazônica pode ter feito com que os índices de fevereiro incluam desmate de períodos anteriores, além de alterações florestais que poderiam eventualmente ter “autorizações de supressão emitidas por secretarias estaduais de Meio Ambiente” —ou seja, seriam áreas de desmatamento legal.

 

Pela forma como é elaborado e prevendo esse tipo de variação, o dado do Deter é usado para analisar tendências, que são consolidadas a cada três meses. Ou seja, os números que darão um diagnóstico mais sólido sobre o começo deste ano devem sair apenas ao final do primeiro trimestre.

 

Claudio Almeida, coordenador do Programa de Monitoramento da Amazônia e Demais Biomas do Inpe, explica que o ideal é observar os resultados do Deter levando em consideração períodos mais longos. “Esse dado obviamente atende à necessidade de saber onde está o desmatamento, mas essa comparação mês a mês não é a mais adequada.”

 

Isso não quer dizer, porém, que o recorde registrado no mês passado não mereça atenção, afirma Almeida. “O dado de fevereiro muito mais alto indica uma preocupação com o período. Existe um movimento de desmatamento que continua existindo naquela região e numa intensidade que é significativa.”

 

Os recordes de fevereiro vêm após registros de queda nos dois biomas no mês anterior: na Amazônia de 61% e no cerrado de 10%. Parte deste resultado, contudo, pode ser atribuído à quantidade de nuvens, que tem potencial de ter atrapalhado o registro de áreas desmatadas. A cobertura em janeiro era de 33% na floresta amazônica e caiu para 20% em fevereiro. No cerrado, a taxa foi de 39% para 29%.

 

Rômulo Batista, porta-voz de Amazônia do Greenpeace Brasil, diz que o cenário é complexo e que analisar apenas o percentual de cobertura de nuvens pode não resultar em uma resposta objetiva.

“Se, por exemplo, no mês de janeiro as áreas da fronteira da destruição estavam mais encobertas, você não tem a capacidade de detecção, porque os satélites não veem pela nuvem. E, se em fevereiro você teve uma janela em que teve menos cobertura nessas áreas, a gente pode ver esse aumento.” 

Yuri Salmona, diretor executivo do Instituto Cerrados, aponta que o desmatamento precisa ser analisado como uma linha de tendência, que era de forte alta no cerrado nos últimos quatro anos. “Tem todo um ambiente institucional e um contexto econômico que favorecem a manutenção da tendência de crescimento e desmontar isso leva um certo tempo”, diz ele.

 

“Hoje em dia o cerrado é quase 50% desmatado, uma área quase do tamanho do Chile. Desse total, mais de 90% é para uso da agropecuária”, explica, acrescentando que a vegetação é removida principalmente para dar lugar a pastagens, para produção de carne e leite, e para a soja.

 

Salmona aponta, ainda, que a concentração da destruição na área do Matopiba acontece justamente porque é nessa região que existe a maior porção preservada do bioma, enquanto no resto do país a maior parte do cerrado já foi desmatado. É também ali que estão muitas espécies endêmicas e formações de ecossistemas e habitats que não existem em outros lugares.

 

O MMA, o Ibama e o Ministério da Justiça e Segurança Pública foram procurados para detalhar seus planos para controlar o desmatamento, mas não responderam até a publicação desta reportagem.

 

No último dia 27, quando se reuniu com o enviado especial do governo dos EUA para o clima, John Kerry, a ministra Marina Silva falou da prévia dos dados do Deter de fevereiro, que já apontavam o recorde no desmate. Ela afirmou que existe uma “ação criminosa” em atuação e que o governo estaria se preparando “para fazer o enfrentamento”.

 

“Estão desmatando mesmo no período chuvoso. É uma espécie de revanche às ações que já estão sendo tomadas na ponta. E vamos seguir trabalhando, este é nosso objetivo. Não somos como o governo anterior, os dados são transparentes”, afirmou a ministra.

 

Com Folhapress – São Paulo

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