Por Sara Giampá, pesquisadora científica da Biologix

Durante muito tempo, o sucesso profissional foi associado a jornadas longas, noites mal dormidas e à máxima de que “quem dorme, não lucra”. Em pleno 2025, essa mentalidade ainda resiste em muitas empresas e perfis de liderança. Mas a ciência é clara: dormir pouco compromete não só a saúde, mas também a produtividade — exatamente o contrário do que prega a cultura do excesso.

O sono não é luxo, nem tempo perdido. É uma função biológica essencial, durante a qual o corpo se recupera, o cérebro organiza memórias, processa emoções e se prepara para novos aprendizados. Quando negligenciado, o sono impacta diretamente o raciocínio, a tomada de decisões e a capacidade de lidar com desafios. Um profissional privado de descanso pode até estar fisicamente presente, mas mentalmente ausente, fenômeno conhecido como presenteísmo, que representa prejuízos reais à performance e aos resultados das empresas.

Ainda assim, o mito do “dormir pouco e render mais” segue romantizado em muitas organizações. Há inclusive, quem associe exaustão a comprometimento. Essa lógica, porém, é insustentável. O que se vê são profissionais sobrecarregados, emocionalmente esgotados, com queda de produtividade e aumento dos erros. A longo prazo, o resultado é uma bomba-relógio: crescimento dos índices de burnout, ansiedade, depressão e doenças físicas, como distúrbios cardiovasculares e baixa imunidade.

Um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelou que longas jornadas de trabalho estão associadas a um aumento de 35% no risco de AVC e 17% no risco de doenças cardíacas. Já a Associação Brasileira do Sono estima que cerca de 73 milhões de brasileiros sofrem com problemas relacionados ao sono, fator diretamente ligado ao crescimento dos casos de transtornos mentais. No ambiente corporativo, esse cenário se traduz em altos índices de absenteísmo e queda de produtividade.

A ideia de que dormir menos libera mais tempo para produzir ignora um ponto fundamental: produtividade não é sobre quantidade de horas acordado, mas sobre qualidade de atenção e energia disponível. E isso só se conquista com descanso adequado. Dormir bem é, inclusive, uma condição indispensável para a criatividade e a inovação, habilidades centrais no mercado atual.  Embora cada organismo tenha suas particularidades, recomenda-se que adultos durmam entre 7 e 9 horas por noite para manter o equilíbrio físico, emocional e cognitivo.

É preciso repensar a forma como o desempenho profissional é medido. Isso passa por um ambiente que respeite o tempo de desconexão, incentive hábitos saudáveis e compreenda as particularidades de cada colaborador. Algumas empresas já vêm adotando práticas como horários flexíveis, home office e programas de educação sobre sono, passos importantes para uma mudança cultural que valorize o bem-estar como estratégia de eficiência. Nesse contexto, ganha força a tendência do Chronoworking, que propõe adaptar as rotinas de trabalho ao relógio biológico de cada pessoa. 

Como disse o escritor Timothy Gallwey: “a capacidade de parar é tão importante quanto a capacidade de andar”. O sono não atrasa ninguém. Ao contrário, ele prepara o terreno para que a gente avance com mais clareza, energia e propósito!

*Sara Giampá é pesquisadora científica da Biologix, doutora em Ciências pelo InCor-FMUSP e mestre em Ciências pela UNIFESP. Também é profissional de Educação Física pela UNIFESP.