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Decisão inédita no AC enquadra internauta que ofendeu mulher trans na web em crime de racismo


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A Justiça do Acre deu uma decisão inédita no estado com relação a um caso de transfobia. A criminalização da homofobia está sendo debatida no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) e, nesse julgamento, a Suprema Corte avalia se a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero deve ser considerada crime.

P U B L I C I D A D E

A decisão da justiça acreana foi após a denúncia do Ministério Público do Acre (MP-AC), quando uma mulher trans oficializou a denúncia através do Centro de Atendimento à Vítima (CAV), que acompanhou o caso.

A vítima foi ofendida na internet ao anunciar que colocou o nome social no título de eleitor. A primeira audiência do caso ainda deve ser marcada.

Na postagem, o internauta se mostra completamente inconformado com a possibilidade da mulher poder usar o nome social no documento e começa a ofender ela usando palavras de baixo calão.

Em uma das postagens, ele diz: “vocês são uma vergonha, querem respeito, mas não respeitam nem a própria família”. Ele continua e chega a dizer que trata homens “na porrada”.

Ataques virtuais

As ofensas contra a mulher trans, que prefere não se identificar, foram nas redes sociais. Ela disse que ao saber que podia usar o nome social no título de eleitor decidiu compartilhar a novidade nas redes sociais e foi aí que começaram os ataques.

“Como a gente tinha conquistado o benefício de poder usar o nome social no título eleitoral, achei tão bom, me senti tão feliz, que decidi fazer uma publicação na minha rede social e, por causa dessa publicação, comecei a sofrer várias agressões por parte dessa pessoa que se achou no direito de me criticar, de me ver como uma pessoa sub-humana”, relata.

Denúncia do MP

O caso ganhou repercussão e o promotor Leandro Portela, responsável pela Promotoria de Direitos Humanos e ouvidoria do MP, diz que decidiu fazer o pedido, usando o mesmo entendimento aplicado às penas de racismo.

“Depois da oitiva, foi encaminhado ao promotor de Justiça e, interpretando o caso, ele resolveu fazer a denúncia, mas não seguindo o padrão do artigo 144 do Código Penal, por injúria, e sim por equiparação a racismo, no caso de uma trans que queria inserir o nome social no título de eleitor dele”, explicou o promotor.

Portela explica que a equiparação tem consequências significativas, principalmente do ponto de vista da punição.

“O enquadramento seria diferente, já que a injúria é uma lei extremamente branda. Além disso, o racismo é imprescritível, ao contrário do que se fosse aplicado o [artigo] 141. É uma diferença de punição muito grande”, acrescentou.

Tribunal de Justiça do Acre acatou a denúncia do MP — Foto: Reprodução/Google Street View

Tribunal de Justiça do Acre acatou a denúncia do MP — Foto: Reprodução/Google Street View

Entendimento do juiz

Em decisão inédita, o juiz Danniel Bomfim, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Rio Branco, aceitou a denúncia, em novembro de 2018. Ao G1, o magistrado disse que a decisão veio por causa da demora do STF em reconhecer a homofobia e transfobia como crime.

“Entendo que é perfeitamente possível que o conceito de racismo se aplique à discriminação social contra grupos minoritários e não só contra negros”, disse o juiz.

O juiz diz que a demanda envolve reconhecimento de que a homofobia e a transfobia se enquadram no conceito de racismo ou subsidiariamente que sejam entendidas como discriminação que atenta contra os direitos e liberdades fundamentais do ser humano.

“E, nesse sentido, a demora do Congresso Nacional em criminalizar a homofobia seria inconstitucional, tendo em vista o dever de editar a legislação criminal sobre a matéria. Entendo que é perfeitamente possível que o conceito de racismo se aplique à discriminação social contra grupos minoritários e não só contra negros”, pontuou.

Longo caminho contra o preconceito

Mesmo com essa pequena vitória, o promotor Leandro Portela disse que ainda há um longo caminho de conscientização. O objetivo agora, segundo ele, é lutar para que não exista mais esse tipo de discriminação.

“É uma questão de cultura e a mudança de cultura pressupõe reiteração obsessiva de hábito de prática, então, temos que lutar por um longo tempo para conseguir que não tenhamos mais esse tipo de discriminação, de preconceito, de racismo contra um grupo minoritário e a constituição determina que nós temos que combater qualquer tipo de discriminação”, concluiu Portela.

‘Demonizam transexualidade’

A vítima disse que a decisão de equiparar o crime de homofobia e transfobia ao de racismo foi sábia, já que o agressor vai poder ter realmente um sentimento de punição.

“A pessoa só aprende quando aquilo se torna crime. Ninguém, até hoje, dentro da sociedade, viveu para agradar todo mundo, mas a gente precisa respeitar e se não respeitar por bem, vai ter que respeitar de alguma forma, e que seja criminalizada”, disse.

Sobre os ataques, a vítima relatou que o autor agiu como se visse aquilo apenas como moda, ou uma forma de querer aparecer, ou querer ser melhor do que alguém.

“Foram vários tipos de ataques, do melhor de todos é chamar de aberração, de que Deus precisa vir resolver isso. Para a sociedade que ainda está vivendo dentro de um conservadorismo, as pessoas costumam muito demonizar a transexualidade, a homossexualidade, e não entendem que isso não é um comportamento que se adquiri, mas é uma forma de a pessoa viver e existir”, lamenta.(G1)

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