Líderes empresariais avaliam que mudança vai além da lei e exige transformação cultural na gestão; incertezas iniciais e impacto no caixa estão entre os principais pontos de atenção

A aprovação da Reforma Tributária, após décadas de discussões e adiamentos, inaugura um novo capítulo na economia brasileira. Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132 e a regulamentação iniciada em 2025 pela Lei Complementar 214/25, o sistema passa a substituir PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS por dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência estadual e municipal.

O desenho do novo modelo promete simplificação, padronização e mais transparência. Mas especialistas e empresários alertam que o processo de transição, previsto para durar até 2033, exigirá cautela, planejamento e investimentos em tecnologia e governança fiscal.

Para Rodrigo Monteiro, CEO do Clube CDC, o empresariado precisa agir sem demora. “Essa reforma muda a forma de pensar o tributo no Brasil. Quem não se preparar vai perder competitividade. A conta não será igual para todos — e só pesará mais para quem continuar no escuro”, afirma Monteiro.

De acordo com levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgado em abril, 76% das companhias ainda não iniciaram um plano estruturado de adaptação à reforma e 52% afirmam não compreender claramente os impactos sobre seus setores.

Na visão de Paulo Motta, empresário com atuação em tecnologia e investimentos, o alcance da reforma vai além da legislação. “Não é apenas uma alteração de lei, mas uma transformação cultural contábil e jurídica. Esse é um momento de troca entre líderes e de construção coletiva de práticas que funcionem na realidade”, diz Motta.

Para Luciano Menezes, CEO da B2WE Assessoria Tributária, escritórioa de expressão nacional com plataforma de integração de negócios que conecta empresas a soluções de tecnologia, gestão e consultoria estratégica, os efeitos da reforma precisam ser observados com equilíbrio, pois podem haver ganhos importantes, mas também riscos que não podem ser negligenciados.

Entre os pontos positivos, ele lista:

  • Simplificação do sistema, com menos burocracia e regras mais claras;
  • Maior transparência sobre a carga tributária em cada operação;
  • Redução do potencial de litígios;
  • Ganhos de competitividade, com menos tempo e custos em obrigações acessórias;
  • Busca de neutralidade, diminuindo distorções entre setores.

Mas Menezes também destaca os desafios:

  • Transição longa e custosa;
  • Risco de aumento de carga em determinados segmentos;
  • Impactos no fluxo de caixa devido à nova sistemática de créditos;
  • Insegurança no período inicial, até que as regras sejam testadas;
  • Penalização relativa de comércio e serviços em comparação à indústria.

“Historicamente, o governo fala uma coisa e escreve outra. Isso exige cautela redobrada das empresas. Ter um Comitê Fiscal e Tributário, atuando como conselho consultivo, pode ser decisivo para avaliar riscos, identificar oportunidades e orientar estratégias seguras”, avalia Menezes.

Lucro Real e Simples Nacional

Menezes afirma que as empresas optantes pelo Lucro Real têm valores a recuperar de forma administrativa, por não se tratar de tese tributária, mas sim de direito líquido e certo. Esse montante pode variar de 0,5% a 2,5% sobre o faturamento bruto dos últimos cinco anos. A garantia está no 4º item da Lei 10.833, de 29/12/2003.

E, embora o foco das discussões esteja voltado às grandes corporações, os pequenos empresários também sentirão os efeitos da reforma. O Simples Nacional foi mantido, mas especialistas apontam que a convivência entre regimes pode trazer complexidades adicionais.

Empresas de menor porte que compram insumos de fornecedores fora do Simples terão de lidar com créditos tributários de forma diferente, o que pode afetar o fluxo de caixa. Além disso, há receio de que a uniformização das alíquotas reduza vantagens competitivas hoje existentes em determinados setores.

Luciano Menezes destaca que a adaptação dos pequenos dependerá sobretudo de acesso à informação e apoio técnico. Associações de classe e consultorias já alertam que muitos micro e pequenos empresários ainda não têm clareza sobre como a reforma vai impactar suas operações diárias — desde a precificação até a gestão de contratos com fornecedores e clientes.