Nos últimos 35 anos, já escrevi diversas vezes sobre as ameaças que vêm do céu, como asteroides, cometas e lixo espacial. Agora, uma nave espacial soviética reentrará na Terra, trata-se da Cosmos 482, lançada em 31 de março de 1972, que deveria ir para Vênus, mas falhou e ficou em órbita elíptica da Terra, a 210 km no perigeu e 9.800 km no apogeu, com inclinação de 51,95 graus.

Nesse perigeu, há um pouco de atmosfera que atrita os satélites naturais e artificiais e, no caso, foi derrubando a nave russa um pouquinho todo ano. Após 53 anos, já está atingindo a alta atmosfera e cairá, podendo ser na cabeça de alguém a qualquer momento. E inteira, explicarei o porquê.

A sonda foi projeta para suportar as terríveis condições do planeta Vênus, ou seja, 300 G de aceleração e 100 atmosferas de pressão (é como mergulhar a mil metros no oceano). O módulo de pouso que deveria pousar na superfície de nosso planeta vizinho é um objeto esférico de cerca de um metro de diâmetro, pesa 495 quilogramas e está equipado com um escudo térmico para sobreviver à reentrada, o que poderá fazer com a nave fique inteira ao atingir o solo da Terra.

Curiosamente, a nave está esquipada com um sistema de paraquedas que não deve funcionar após tantos anos. Da mesma forma, o escudo térmico também pode estar comprometido após tanto tempo em órbita.

Cientistas da Universidade de Tecnologia de Delft prevêem que a nave espacial reentrará por volta de 10 de maio e impactará o solo a 240 km/h, considerando que permaneça intacta. Embora seja um risco real, não deve ser motivo de muita preocupação.

A queda deve ocorrer em qualquer lugar entre as latitudes 52° norte e 52° sul, cobrindo uma vasta área que inclui os EUA, América do Sul, África, Austrália e a maior parte da Europa e Ásia ao sul do Círculo Polar Ártico.

O risco estimado é pequeno, mas, em verdade, o foguete da Cosmos separou-se em quatro pedaços, sendo que dois deles já caíram no sul da Nova Zelândia em uma fazenda, sem causar prejuízos, eram peças de titânio.

Um estudo publicado na Scientific Reports relatou que regiões de alta densidade próximas a grandes aeroportos têm, atualmente, 0,8% de chance por ano de serem afetadas por uma reentrada descontrolada de foguete. Já em áreas aéreas mais amplas, mas ainda movimentadas, como o nordeste dos EUA ou grandes cidades asiáticas, o risco sobe para 26%. Com o grande aumento do lixo espacial, esse risco cresce ainda mais e já merece atenção das autoridades federais.

Em fevereiro, por exemplo, restos de um foguete SpaceX Falcon 9, lançado nos EUA, reentraram na atmosfera sobre a Polônia, dois pedaços grandes, cada um com 1,5m x 0,9m foram encontrados no solo. Na véspera do Ano Novo, fragmentos de metal, supostamente de um foguete, caíram em uma vila no Quênia. Em março de 2024, a NASA foi processada por uma família da Flórida cuja casa foi atingida por um pedaço de metal. A próxima vítima pode ser você.

Em caso de relato de quedas no Brasil, quando o INPE é notificado, desloca-se uma equipe para recolher os restos e devolver à nação responsável, se identificada.

Mario Eugenio Saturno (fb. com/Mario.Eugenio.Saturno) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano